Uma noite no Chichilo – Boca no Mundo
Home » Bar » Uma noite no Chichilo
07 de outubro de 2014

Uma noite no Chichilo

Sophia Loren está bem na foto, batendo um pratão de macarronada sob uma coleção imensa de camisas de times argentinos penduradas em cabides. Na parede descascada, alguém escreveu com caneta pilot uma dedicatória: “Para Chichilo con todo mi cariño, Diego Maradona”.

Antes de convidar a família ítalo-portenha para seu casamento — motivo de fotografias e objetos atrás do balcão —, o ídolo argentino comeu muitos caracóis à bordalesa, rãs fritas e ‘patitas de cordero’ preparadas pela Mamma Esther, matriarca e fundadora da cantina que ocupa desde 1956 uma esquina do bairro de La Paternal, em Buenos Aires.

Em noite de chuva e frio leve perfeitos para aumentar a fome, fui conduzido pelo amigo, crítico e escritor de gastronomia Pietro Sorba (outro italiano que adotou a cidade) à casa de fachada vermelha e branca onde Francisco ‘Cacho’ (o filho de Esther) e família comandam um espetáculo que deixa a maior parte dos modismos culinários contemporâneos na categoria Festa Infantil.

O Banquete

Avental vermelho por cima da roupa, Cacho está em todos os lugares da casa ao mesmo tempo, enquanto o filho serve as mesas e a mulher, Susana, cuida de bebidas, frios e sobremesas preparadas atrás do balcão. Um balé familiar incessante que abre o apetite para os antipastos.

Tomates secos fantásticos feitos na casa com azeite, ervas e muito alho, mozarela de búfala e grandes folhas rasgadas de manjericão. Salame caseiro, um portento. Bolinho frito de verduras, incríveis cebolas roxas no vinagrete, mozarela à milaneza com espinafre refogado, e o bem-vindo cérebro bovino em escabeche, macio a ponto de virar um patê no garfo.

“Os netos hoje vem para recordar o que comiam aqui com seus avôs, quando eram crianças”, diz Cacho. Pensando que eu era paulista, desafiou: “Espera que vou trazer um polpetone melhor que os que você come em São Paulo”. Disse para ele esquecer. Como carioca, já estava impressionado antes mesmo de provar.

Vieram duas variedades de massa artesanal cortadas à mão, uma delas com linguiça calabresa que fez as papilas vibrarem. E pintou a bresaola, fina e envolvendo acelga em molho intenso de tomates puxado no alho. O polpetone chegou matador, com molho vermelho que se misturava à mozarela derretida por dentro da carne.

Foi tamanha a comilança que não houve na mesa quem pudesse aceitar o convite irrecusável, em outras condições, para provar algumas das 12 sobremesas da casa.

Enquanto pensávamos, Susana batia na hora um chantilly para a Chicholina, trocadilho com a rainha italiana do erotismo para um ‘porn-postre’ que inclui sorvetes de doce de leite e creme, merengue, doce de leite, calda de chocolate, creme e morangos por cima. Impressionante.

Bodegones

Entre outros livros e guias, os melhores escritos sobre roteiros gastronômicos argentinos, Pietro Sorba é o autor de Bodegones de Buenos Aires, que traz resenhas e lindas fotos de 79 estabelecimentos que unem história, tradição, sabor, ambientes e raízes da culinária portenha, maravilhas que correm por fora dos guias turísticos.

Convidado por Pietro, com o apoio do Governo de Buenos Aires e da embaixada brasileira, participei com imenso prazer, em setembro, da 2ª Semana de Los Bodegones Porteños, falando sobre os botequins cariocas tradicionais e descobrindo as relações e semelhanças que guardam com os bares hermanos. Ô, sorte.

Conheça as cores e a história de um senhor botequim na região de Palermo.

Chichilo. Camarones 1901, La Paternal, Buenos Aires, Argentina. Tel: 11 4581-1984/4584-1263. De quarta a sexta, das 20h à 0h; sábados, das 12h às 16h, e das 20h à meia-noite; domingos, das 12h às 16h. Atenção: Só aceita dinheiro.




Nossa Casa

 

Se você não faz fotossíntese, veio ao lugar certo.

 

Boca no Mundo é o blog do jornalista Pedro Landim.

 

Um lugar para quem adora comer, beber, cozinhar, e falar de comida.

 

Sejam muito bem-vindos.